segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Inovação deve ter foco, dizem analistas

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Carlos Américo Pacheco, professor da Unicamp, sobre as escolhas do país:

“Não vamos conseguir resolver todos os problemas sistêmicos no curto prazo”

A indústria brasileira vem perdendo espaço no mercado doméstico para os produtos importados e também perdeu competitividade para concorrer em outros países com produtos "made in China", "made in Coreia", "made in" algum país asiático. Embora o câmbio seja hoje apontado como o grande vilão da indústria brasileira, ele não é o único responsável pela perda de participação dos produtos brasileiros no consumo doméstico e também no de outros países. Para um grupo cada vez maior de especialistas, a recuperação da participação perdida e a conquista de novos espaços passa pela inovação. Mas o importante, insistem, é traçar uma rota de incentivo à inovação com foco nos segmentos onde o país tem capacitação e possa fazer diferença. A ideia, dizem, não é abandonar a indústria, mas fazer "escolhas" em setores nos quais o país pode dar um salto a médio e longo prazo.

Na última década, o país perdeu competitividade de tal forma que levou o professor Antonio Barros de Castro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a caracterizar a indústria brasileira, com honrosas exceções, de "descartável do ponto de vista internacional". Para Barros de Castro é preciso "um ativismo forte, mas não para manter, e sim para transformar".

Ele e outros dois especialistas em política industrial - os professores David Kupfer, também da UFRJ, e Carlos Américo Pacheco, do Instituto de Economia da Unicamp - avaliam que há a necessidade de uma política científica e tecnológica diferente daquela que vem sendo realizada. "O foco da política tecnológica brasileira tem que ser para segmentos ou setores ou para parte de setores ou para um conjunto de setores similares. A questão de ciência e tecnologia é um desafio em qualquer lugar do mundo. O Brasil não é diferente", avalia Kupfer.

Carlos Américo Pacheco destaca que o Brasil vai ter que fazer escolhas. "Não vamos conseguir resolver todos os problemas sistêmicos no curto prazo. Há falta de recursos humanos e de ação coordenada, e toda essa agenda é de médio e longo prazos. Temos que resolver questões de logística e de infraestrutura, e o problema cambial não vai ser solucionado de um dia para outro. Temos aí dois anos para equilibrar apenas as questões macroeconômicas e depois poderemos realmente avançar " diz.

Tanto ele como Kupfer destacam áreas nas quais o país pode avançar e posicionar-se internacionalmente de uma forma mais competitiva e diferenciada, observando que esses segmentos "são até óbvios", como lembra o professor da Unicamp. "Andar firme no agronegócio, em toda a cadeia que envolve o petróleo, com o pré-sal, manter a base de desenvolvimento científico no que diz respeito aos recursos da biodiversidade, energia, na aeronáutica, setor aerespacial que são indutores de tecnologia pelo mundo afora são setores que formariam um mapa interessante para serem depois completados com dimensões da economia do conhecimento", lista Kupfer.

Ele avalia que todos os setores citados contam com bases bem constituídas, mas precisam continuar recebendo investimentos para abrir caminhos novos e acumular mais massa critica para avançar. "Não se deveria definir um número muito grande de áreas, mas algumas com margem ampla de ação de longo prazo, envolvendo recursos de empresas e governamentais", diz o professor da UFRJ.

Kupfer lembra que não foi por acaso que o país avançou no agronegócio. "A ideia de celeiro do mundo não é porque temos terra e sol. Foi reflexo de décadas de um sistema de acumulação, inovação e pesquisa tecnológica. Na agropecuária recente, houve um puxão na ciência que deu oportunidade para descobertas na biologia e genética, e, do lado econômico, a questão do alimento ganhou uma difusão de teses de segurança alimentar. A bioenergia, por exemplo, poderá encontrar soluções na agropecuária. Trata-se de uma linha que podemos avançar muito e chegar o mais próximo da fronteira internacional", diz ele.

O professor lembra que já existe toda uma cadeia voltada à inovação que, se exacerbada, tem tudo para avançar ainda mais. O amplo envolvimento de um setor trouxe resultados importantes para o país, lembra Carlos Américo Pacheco, citando o exemplo da indústria aeronáutica. Tudo começou nos anos 40, com a criação de órgãos e a formação de mão de obra no setor, que levaram à criação da Embraer, empresa com destaque no cenário internacional.

O professor da Unicamp lembra que as energias renováveis estão na agenda mundial e nessa agenda o Brasil está devendo ao mundo. "Os Estados Unidos estão buscando novas fronteiras na biotecnologia e a China também. Para sermos cada vez mais competitivos, é preciso recursos para termos uma biotecnologia de classe mundial", afirma.

Na avaliação dos especialistas, o país tem uma "joia da coroa", como define Kupfer ao se referir a tecnologia envolvendo o pré-sal. "É preciso concentrar toda a política pública nessa mina de ouro para potencializar o conhecimento que se transfere para a indústria eletrônica, mecânica, a robótica e a ligada à tecnologia do conhecimento que estará envolvida ao redor", afirma o professor da UFRJ.

Ao tomar posse no fim de janeiro do comando da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia, Glauco Arbix, especialista em politica industrial e inovação, deu um sinal da razão de ter sido escolhido. Ele foi taxativo: "O Brasil precisa de um choque de inovação em todas as esferas e dimensões, na economia e na sociedade", disse. Falou em "mobilizar o Brasil para inovação", mas lembrou que "a inovação é uma combinação de processos, conclusões e síntese de eventos anteriores". E reconheceu: "Não há varinha de condão. Há travessia, criação e uso intensivo de conhecimento processado por pessoas", disse.

Heloisa Magalhães|Do Rio/14/02/2011/Leo Pinheiro/Valor

Ênfase na inovação | Valor Online

Ênfase na inovação | Valor Online

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Pedidos de patentes do Brasil caem 14% em 2010

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O Brasil perdeu terreno em inovação tecnológica na comparação internacional, pelo que mostra relatório da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) divulgado ontem.

Em 2010, a economia do país cresceu, mas seus pedidos internacionais de patentes caíram 14,4%. Em comparação, progrediram 56,2% na China, 20,5% na Coreia do Sul, e 15,4% na Índia. A Rússia registra também mais patentes que o Brasil.

O Brasil caiu um posto, para 24ª posição entre 142 países membros do Tratado de Proteção de Patentes da OMPI. Esse acordo dá aos inventores e às indústrias proteção simultânea de uma invenção.

No caso do Brasil, suas 422 demandas internacionais de proteção de inovação representam mais da metade da América Latina, onde o segundo foi o México com 145. A Argentina só fez 5. Toda a América Latina, porém, só representou 6,5% dos pedidos de patentes da China, país que paradoxalmente continua a ser também acusado de forte pirataria de inovação estrangeira.

"As taxas de crescimento rápido na Ásia testemunham uma aceleração da diversificação geográfica das atividades de inovação", disse o diretor-geral da OMPI, Francis Gurry. Entre as dez maiores companhias demandantes de proteção de patentes, seis são asiáticas, três europeias e uma americana.

A primeira foi a Panasonic, do Japão, com 2.154 pedidos, seguida da chinesa ZTE,com 1.863. Por setor, a comunicação digital foi a que teve o mais rápido crescimento com 17,3% dos pedidos.

No Brasil, as empresas que mais pediram proteção de patente foram a americana Whirlpool, com 39, Petrobras, com 15, e a europeia Electrolux, com 12. A boa surpresa é que a Universidade Federal de Pernambuco fez nove pedidos, enquanto a Embraer apenas cinco.

Para Gurry, a diferença entre a China e os latinos, incluindo o Brasil, é que os chineses têm um projeto persistente de transformar o país em centro de tecnologia. "A base tecnológica é um processo de longo prazo, e a pesquisa e desenvolvimento na China e Índia avançam", disse.

Globalmente, as demandas de patente aumentaram 4,8%, totalizando 162.900, ainda abaixo do nível de 2008, de antes da pior recessão dos últimos tempos.

Os Estados Unidos continuam a ser o maior utilizador do sistema global de patentes, com 44.855 pedidos, seguido do Japão e da Alemanha. Mas o número dos americanos em 2010 ainda é 20% inferior ao de antes da crise financeira global em 2008, ilustrando o quanto a sua economia foi afetada.

Por outro lado, o diretor da OMPI declarou-se "esperançoso" de que no futuro próximo o Brasil venha enfim a aderir ao Protocolo de Madri. Isso reduziria muito o custo dos exportadores para proteger seu nome e frase associada a ela contra o uso por outros produtos. Segundo a entidade, para registrar uma marca hoje em 55 países, a empresa gasta cerca de US$ 100 mil. A Índia deve aderir este ano.

Assis Moreira | De Genebra - Valor 10/02/2011

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

MCT quer aperfeiçoar mecanismos de incentivo à pesquisa e à inovação

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Estão em discussão no Congresso Nacional os mecanismos para expansão da Lei, que oferece incentivos fiscais às empresas que realizam pesquisas tecnológicas e de inovação

Aperfeiçoar os programas de incentivo à isenção fiscal. Desde que assumiu o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Aloizio Mercadante tem reforçado essa ideia. A pasta já conta com os benefícios oferecidos pela Lei do Bem e o ministro pretende aprimorar ainda mais as políticas de incentivo à pesquisa e à inovação.

A Lei do Bem (11.196/05) oferece incentivos fiscais às empresas que realizam pesquisas tecnológicas e de inovação, no entanto, Mercadante acredita que o sistema ainda pode ser melhorado. Para isso, estão em discussão no Congresso Nacional os mecanismos para expansão da Lei e o ministro pretende ainda avançar esses incentivos para ganhar mais autonomia nos setores da indústria, aviação e automotiva.

Para se utilizar da lei, é necessário instalar na empresa um programa de inovação com projetos eficazes. As empresas grandes chegam a desenvolver 400 projetos de inovação por ano. Na lista de beneficiárias, há empresas de setores e portes variados, desde uma pequena fábrica de calçados até gigantes como Ambev e Alcoa. Do setor de serviços, um exemplo é a Contax, do segmento de call center. Especialistas explicam que a crise mundial é uma oportunidade para instalar processos de inovação nas empresas, frente à necessidade de atrair e reter clientes e de reduzir custos.

No primeiro ano da Lei, em 2006, o número de empresas beneficiadas por incentivos fiscais era 130. Em 2009, esse número saltou para 542 empresas, ou seja, 317% a mais em relação a 2006. Ao se somar o número de beneficiárias da Lei do Bem nas regiões Sudeste e Sul para cada ano, é observado que essas empresas correspondem a mais de 92% do total de empresas beneficiadas em todos os 4 anos.

Isso se justifica em razão do maior desenvolvimento industrial dessas regiões, que, por sua vez, apresentam maior capacidade de se apropriar dos benefíciosmesmo período, o investimento em Pesquisa e Desenvolvimento das empresas que se beneficiaram da Lei do Bem evoluiu de 2,1 bilhões, em 2006, para 8,3 bilhões, em 2009, quase quadruplicando nesses quatro anos. Dos recursos investidos em 2009, foram aplicados R$ 0,21 bilhão em bens de capital e R$ 8,33 bilhões em despesas operacionais de custeio.

A distribuição regional desses recursos confirma as melhores condições apresentadas pela região Sudeste na utilização dos incentivos, respondendo por 95% dos recursos aplicados em P&D.

(Assessoria de Comunicação do MCT - 08.2.11)

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

USP e MIT levam inovação tecnológica para comunidade carente

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Valéria Dias - Agência USP - 03/02/2011


USP e MIT levam inovação tecnológica para comunidade carente
A idéia original do projeto é oferecer inovações tecnológicas que não necessitem de muito investimento. [Imagem: Tereza Cristina Carvalho]

As primeiras ações de uma parceria envolvendo o Laboratório de Sustentabilidade (LASSU) da Escola Politécnica (Poli) da USP e o MIT D-Lab (Design Lab), do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), acabaram de ser entregues para os moradores da comunidade Zé Mineiro, em Embu, na Grande São Paulo.

O projeto tem por objetivo desenvolver tecnologias apropriadas para o atendimento de necessidades de comunidades de baixa renda e de projetos sociais.

Os moradores da comunidade Zé Mineiro receberam tampas para os poços de água que servem a comunidade; bombas d'água; arquibancada coberta para o campo de futebol e um parquinho de diversões para crianças.

Inovações tecnológicas baratas

Partindo da idéia original do projeto - a de oferecer inovações tecnológicas que não necessitem de muito investimento - os pesquisadores implementaram essas ações utilizando materiais de baixo custo e recicláveis, facilmente encontrados na comunidade, como pneus velhos, plástico PVC, madeiras, baldes e canos.

A professora Tereza Cristina Carvalho, coordenadora do LASSU, explica que não há água encanada no local e o recurso é conseguido através de poços caseiros feitos pelos moradores. O problema é que esses poços estavam abertos, facilitando a entrada de sapos, insetos e sujeiras na água.

De acordo com a professora uma das intenções do projeto é transferir o conhecimento para a comunidade. "Entregamos uma tampa para um dos poços, feita com materiais da região, como restos de madeira de construção e plástico. Desta forma, podemos ensinar aos moradores como construir a tampa e eles mesmos ficaram responsáveis pela construção das coberturas dos outros poços", explica a coordenadora do projeto no Brasil.

Segundo a professora, os pesquisadores também fizeram testes na água para verificar se havia contaminação.

Bombas alternativas

No mesmo dia os moradores receberam bombas para facilitar a captação da água, construídas com materiais alternativos, como baldes, canos e plásticos.

O grupo fez um protótipo e deixou instruções sobre como construir outras bombas d'água. Já o parquinho de diversões oferece vários brinquedos produzidos com material reciclado vindo de um centro de reciclagem próximo e com troncos de árvores. Enquanto o campo de futebol ganhou uma arquibancada, também construída com material reciclável.
USP e MIT levam inovação tecnológica para comunidade carente
No mesmo dia os moradores receberam bombas para facilitar a captação da água, construídas com materiais alternativos, como baldes, canos e plásticos. [Imagem: Tereza Cristina Carvalho]

Os alunos também elaboraram um cartaz com informações educativas sobre a importância de procedimentos de higiene para a saúde, como lavar as mãos, e as frutas e verduras. "O cartaz tem grande apelo visual, pois nem todos os moradores da comunidade sabem ler e escrever", conta a professora.

O MIT D-Lab atua em 7 países de economia emergente e, no Brasil, vem atuando desde 2004 em conjunto com a USP. A parceria com o LASSU começou em 2010. Neste ano, a abordagem empregada consistiu na definição de três áreas de atuação (água, entretenimento e educação). Nos primeiros dias foram realizadas diversas visitas à comunidade do município de Embu, visando identificar problemas em cada uma dessas categorias, por equipes compostas por membros da comunidade além de alunos da USP, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar-Sorocaba) e do MIT.

Responsabilidade social

O grupo que trabalhou com a comunidade Zé Mineiro, em Embu, é composta por 10 alunos do MIT D-Lab, 9 da USP (6 do Departamento de Engenharia de Computação e Sistemas Digitais (PCS) e 2 da Engenharia Mecatrônica da Escola Politécnica e 1 do Instituto de Psicologia), além de 3 da UFSCar-Sorocaba.

Parte desta equipe está agora em Manaus, onde uma parceria com a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e a Fundação Bradesco pretende levar a iniciativa para as comunidades carentes locais.

Para a professora Tereza, além de auxiliar o desenvolvimento das comunidades envolvidas, a iniciativa também traz benefícios aos alunos participantes. "Muitos alunos da Poli sabem tudo a respeito de circuitos elétricos complexos, mas não sabem instalar uma rede elétrica de uma casa, pois é um conhecimento mais relacionado ao nível técnico. Este projeto coloca o aluno em contato com esse tipo de situação. Ele acaba tendo contato com uma outra realidade e se torna mais sensível para os problemas sociais", destaca a professora.

Para ela, quando este aluno estiver no mercado de trabalho, vai levar toda essa carga de aprendizado e será um líder mais consciente de sua responsabilidade social.

Neste primeiro projeto participaram mais alunos da Engenharia de Computação, mas de acordo com a professora, pretende-se estender a participação para todos os estudantes da USP, de todas as áreas do conhecimento e, também, de outras universidades brasileiras e também da América do Sul.