sexta-feira, 30 de abril de 2010

Mais de 300 projetos inovadores em áreas como TI e saúde serão gerados dentro das escolas, em 2010

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Eles querem chegar lá

A necessidade de inovação fez o administrador Floro Fagundes e mais quatro sócios desenharem um software que controla a glicemia de pacientes a distância. Casado com uma diabética, Fagundes observava a mulher e outros portadores da doença usando caderninhos com anotações e tabelas de cálculos para administrar os índices glicêmicos. "Agora, um programa instalado no celular se comunica com um prontuário médico on-line e calcula as quantidades de carboidratos das refeições e as doses prescritas de insulina", explica. "O médico pode intervir no tratamento do paciente em tempo real."

Hoje, o software GlicOnLine é o carro-chefe da Quasar Telemedicina, pequena companhia de sete funcionários criada em 2004 no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), incubadora de empresas em São Paulo. A invenção já conta com oitocentos pacientes e é usada por 110 médicos. Em 2009, a companhia faturou R$ 130 mil e quer fechar 2010 com R$ 600 mil no caixa. "Vamos firmar parcerias com operadoras de telefonia móvel e entrar no mercado americano."
Foto Destaque

No próximo mês, Fagundes desembarca em São Francisco, na Califórnia, para apresentar a versão em inglês do software para investidores. Mas, para chegar lá, o empreendedor precisou driblar obstáculos que costumam surgir na rota da inovação das pequenas empresas: a falta de agilidade na oferta de crédito, a dificuldade de atração de investimentos e a burocracia para registrar novos produtos. "Demorei um ano para obter o registro de um software que pode salvar vidas", lembra.

Segundo pesquisa feita pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae-SP), 39% dos empreendedores precisariam de impostos menores para realizar inovações em seus produtos, enquanto 22% necessitam de empréstimos bancários para tirar os projetos das gavetas. Ao mesmo tempo, apenas 20% das empresas ouvidas correm atrás de cursos e consultorias para se diferenciar da concorrência e 13% das companhias querem mais divulgação dos seus inventos.

Para vencer essas dificuldades, entidades ligadas às áreas de financiamento, incubação de negócios e de estímulo a programas de pesquisa arregaçam as mangas. Até 2012, o Sebrae Nacional pretende aumentar em 30 mil o número de empresas inovadoras no país - o dobro do que existe hoje, de acordo com o IBGE. Este ano, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) vai oferecer R$ 1,6 bilhão - R$ 700 milhões a mais que em 2009 - para o desenvolvimento de projetos de inovação, dentro do Programa Inova Brasil, de financiamentos reembolsáveis.

Já os principais fundos de venture capital (ou capital de risco), concentrados em quatro Estados, contam com pelo menos US$ 1 bilhão em recursos para apoiar ideias inovadoras que nem sempre saem das incubadoras. Segundo a consultoria Ernst&Young, até dezembro, mais de 300 projetos empreendedores devem nascer nos bancos das escolas de negócios, como a Fundação Getúlio Vargas (FGV).

No Sebrae, uma das armas para estimular a inovação é o Programa Agentes Locais de Inovação (ALI), que despacha mais de 800 profissionais para empresas em dez Estados. Os agentes visitam as companhias e produzem um relatório gratuito que identifica dificuldades e o que pode ser melhorado no dia a dia do negócio. A partir desse diagnóstico, criam um plano de ação e acompanham a evolução do empreendedor. Até o final de 2010, a iniciativa deve bater na porta de 5,1 mil estabelecimentos de 33 setores.

Para Guilherme Plonski, coordenador do Núcleo de Política e Gestão Tecnológica da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Associação Nacional das Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), o problema da microempresa no Brasil na busca de ações inovadoras não é o fato de ser pequena, mas "de ser sozinha". "Graças a entidades como o Sebrae, as MPEs encontram apoio para compreender e superar os obstáculos à inovação", diz. "Mas é preciso aprimorar a coordenação dos esforços vindos de diversas iniciativas." Criada há 22 anos, a Anprotec gerencia mais de 400 "habitats" de inovação, como incubadoras e parques tecnológicos, em mais de 20 Estados.

"Os resultados obtidos nesses ambientes, planejados para efetivar processos de inovação de produtos e negócios, podem transformar cidades e regiões", assinala. Segundo Plonski, em Florianópolis (SC), a contribuição ao PIB local das empresas de TI geradas em incubadoras já é o dobro do aporte das companhias do setor turístico - que fez a fama da cidade. A capital catarinense tem mais de 500 empresas de base tecnológica que faturaram mais de R$ 1 bilhão em 2009 e empregam mais de cinco mil pessoas.

No Brasil, segundo o IBGE, as atividades industriais com as maiores taxas de inovação incluem os setores de automóveis, máquinas para escritório e equipamentos de informática, equipamentos médico-hospitalares e de automação industrial, além de refino de petróleo, material eletrônico, aparelhos de comunicação, produtos farmacêuticos, celulose e metalurgia. Para Carlos Alberto Miranda, sócio da Ernst&Young, há nichos que são obrigados a realizar investimentos em inovação, como o farmacêutico, de TI e biotecnologia. "Mas o varejo e o setor de serviços já aparecem como os novos investidores do segmento."

Segundo um estudo inédito realizado pela Ernst&Young Brasil com escolas de negócios do país - FGV, Insper - Instituto de Ensino e Pesquisa e Fundação Instituto de Administração (FIA), além do Instituto Endeavor, mais de 300 projetos empreendedores em áreas como TI, indústria pesada, comércio, serviços e saúde serão gerados dentro das escolas, em 2010. Em três anos, pelo menos cem projetos foram apresentados em rodadas de negócios com a participação de fundos de investimento venture capital e angel investors (investidores-anjo). Para os especialistas, se há filas de novos empreendedores em busca de dinheiro, há também grupos interessados em investir em ideias inovadoras e rentáveis.

No Brasil, só em venture capital, segundo levantamento do professor Cláudio Furtado, do Centro de Estudos em Private Equity e Venture Capital da Eaesp-FGV, os recursos somam US$ 1,5 bilhão. Reunidos principalmente na Bahia, Santa Catarina, Rio de Janeiro e São Paulo, os investidores-anjo garimpam empreendimentos inovadores dentro e fora das escolas, com aportes financeiros de R$ 50 mil a R$ 500 mil, por empresa. "Os grupos querem projetos sustentáveis com um bom plano de negócios, e as escolas de negócios costumam concentrar essas garantias."

Para se ter uma ideia, somente na FGV, que forma anualmente 520 alunos, cerca de 25% dos estudantes que concluíram cursos com disciplinas de empreendedorismo e desenvolvimento de planos de negócios tornaram-se empreendedores nos últimos dez anos. No Instituto Endeavor, de capacitação em empreendedorismo, o número de profissionais inscritos em cursos em 2010 saltou para 200, o dobro do ano passado.

Nas entidades de fomento à inovação, os orçamentos já estão definidos para 2010. A Fapesp pilota o Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe), que já apoiou, desde 1997, mais de 1,3 mil projetos de pesquisa em São Paulo. Segundo Carlos Henrique Cruz, diretor científico, em 2010, o programa oferece uma verba de R$ 30 milhões, mesmo valor do ano passado. "Para cada R$ 1 que a Fapesp investiu em um projeto do Pipe, a empresa beneficiada obteve R$ 11 em faturamento e recursos."

Valor,30/04/2010

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