segunda-feira, 29 de agosto de 2011

À caça de talentos


Ao encerrar as inscrições para seu programa Jovens Engenheiros, em julho, a Mineração Usiminas deu início a um intenso trabalho: selecionar 30 entre os 3.600 candidatos formados entre 2008 e 2011 para ocupar, a partir de setembro, as vagas destinadas a jovens graduados nas áreas de engenharia civil, de minas, mecânica, metalurgia, e ambiental, ou em mecatrônica e geologia. O salário inicial, de R$ 4.633, e os benefícios previstos no contrato foram grandes atrativos. Mas havia outro igualmente importante: o acesso a conhecimento especializado por meio de ações de treinamento, além de acompanhamento de engenheiros experientes durante 36 meses.

Criada em 2010 como uma joint venture a partir de parceria com o grupo japonês Sumitomo, a Mineração Usiminas tem como meta, até 2015, elevar de 7 milhões para 29 milhões de toneladas sua produção anual de minério de ferro. E não há nada de que a companhia necessite mais hoje do que profissionais com os conhecimentos técnicos específicos demandados pela atividade.



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Como os candidatos que participaram do programa da mineradora, cerca de 80% dos engenheiros saem hoje da universidade decididos a encontrar um emprego, diz o professor Segen Estefen, diretor de tecnologia e inovação da Coordenação de Programas de Pós-Graduação de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mas a maioria precisa, ainda, de treinamento intensivo por um simples motivo: a falta crônica de profissionais especializados, capazes de atender as necessidades de uma economia em crescimento, está ligada a fatores complexos, de difícil solução, que mistura deficiência nos ensinos básico e fundamental, professores despreparados para estimular o interesse dos jovens pelas ciências exatas, currículos universitários muito teóricos e desvalorização da profissão num passado recente.

Estefen diz que o Brasil precisa investir na melhoria do ensino de base, como fazem Europa, Japão e os países asiáticos, onde a preparação para as ciências exatas começa de forma sólida já no ensino básico. "Aqui, além de não se estimular a preparação de professores capazes de transmitir esses conhecimentos, convivemos com uma cultura de aversão ao risco, um desestímulo ao processo criativo", diz. Nesse ambiente não se formam profissionais inovadores, tampouco jovens cientistas interessados na carreira acadêmica ou em se tornar empreendedores de alta tecnologia, avalia.

Pedro Wongtschowski, presidente do grupo Ultra e do Movimento Empresarial pela Inovação (MEI), ligado à Confederação Nacional da Indústria (CNI), tem a mesma visão: "A forma de ensino no Brasil não desperta a característica inovadora das pessoas. O ensino discursivo continua em muitas salas de aula". Segundo ele, embora a evasão nos cursos de engenharia tenha diminuído de 45% para 20%, ainda é alto o percentual de universitários que deixa a universidade por falta de preparo para acompanhar do curso.

Para Ronald Dausha, diretor de tecnologia e inovação da Siemens, os cursos precisam ter currículos mais adequados e com maior carga de matemática e demais disciplinas que estimulem o raciocínio lógico. Além disso, os pais precisam estimular os filhos a se interessar pelo estudo dessas disciplinas.

"O que faz um país crescer são as ciências duras", complementa o professor Oswaldo Massambani, que levou para o Centro Paula Souza a experiência de coordenador da Agência USP de Inovação, que ajudou a criar. Massambani defende a criação de mais cursos de ciências exatas. "É mais difícil, custa mais, precisa de laboratórios, mas é necessário."

A boa notícia: já se nota um movimento de renovação do interesse dos jovens pelas diversas áreas da engenharia, em decorrência do boom da construção civil, da indústria do petróleo e do agronegócio. Isso sem falar da implantação de diversos programas e iniciativas nos últimos anos que aproximam empresa e universidade, preveem bolsas de estudo para a pesquisa científica e tecnológica, disseminando a cultura de inovação e do empreendedorismo de alta tecnologia. O Inova Paula Souza é uma dessas iniciativas, cuja meta é promover a cultura de inovação entre os 8 mil professores e 200 mil alunos das Escolas Técnicas (Etecs) e Faculdades de Tecnologia (Fatecs) do Estado de São Paulo.

O Idea, do Coppe, é outro. O objetivo do projeto é estimular alunos e pesquisadores a transformar os resultados de suas pesquisas em produtos e novos empreendimentos e, assim, ampliar o número de micro e pequenas empresas de base tecnológica no país, diz o professor Stefen. A grande questão, porém, é como fazer a sociedade despertar para a questão de que a educação básica é fundamental.
Por Marlene Jaggi | Para o Valor, de São Paulo

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